O que eu não queria ter descoberto sobre a prática do Design nas empresas?

Não é novidade para ninguém dizer que é difícil implementar o Design dentro das empresas. E quando eu digo isto, eu estou falando de uma implementação transversal que “respingue” a essência do Design nos âmbitos estratégico, tático e operacional de uma companhia. Mas você sabe porque é tão difícil implementá-lo?

Eu não sabia esta resposta (e talvez ainda não saiba completamente, pois esta não é uma pergunta do estilo “quanto é 2 + 2?”), mas tentando achar indícios, eu investi os dois primeiros anos do meu Doutorado em esforços que me trouxessem mais clareza sobre o assunto. Para tanto, fiz uma pesquisa* de mais de 200 horas com 5 empresas desenvolvedoras de produtos e com quase 100 designers espalhados pelo Brasil.

Esta investigação me trouxe muitos dados e eu mergulhei neles para fazer algumas interpretações. Tentando achar relações e entender as dificuldades de articular mais espaços para os Designers nas empresas é que eu percebi que o furo é bem mais embaixo. Ou seja, existem fatores bastante variados e que estão relacionados com a prática do Design no dia a dia das empresas. (E que eu confesso que nem sei se fiquei feliz em descobri-los.)

Por isto, eu resumi em 4 tópicos os fatos que mais chamaram a atenção em minhas análises. Mas antes de você começar a lê-los, vamos combinar uma coisa? Estas informações estão embasadas em minhas pesquisas e seus dados não podem ser generalizados porque eu não pesquisei todas as empresas do mundo. (Até porque fazer isto seria um trabalho muito maçante. Risos). Felizmente, é claro que tem empresas que enxergam o Design de outra forma. Então, aproveite o texto e me diga se você identifica algum destes aspectos em seu dia a dia ou não concorda com alguma coisa. 

1. O lado mais fraco da corda.

Pela natureza multifacetada do Design, ele possui fronteiras pouco nítidas com outras áreas corporativas e, em algumas vezes, sobrepõe-se a outras disciplinas, como é o caso do Marketing. E vejam bem que quando eu digo “sobrepor-se” aqui, eu não enxergo como um fato negativo. Muito pelo contrario, vejo como uma reunião de esforços do bem.

Então você pode estar pensando: ‘Que legal!. Quer dizer que quando os esforços são compartilhados as recompensas também são compartilhadas?’. Errado. Em muitos casos, percebi que quando um produto e/ou serviço é um sucesso, o mérito é do Marketing. Mas quando ele não vai muito bem… Adivinhem só de quem é o demérito? Do Design. Pois é, sabe aquela história de que a corda estoura no lado mais fraco? Eu percebi que isto faz sentido em algumas situações.

2. Deus quis assim.

Como você sabe, a prática do Design está relacionada com a alocação de vários recursos e pessoas envolvidas em um projeto. No entanto, eu verifiquei que, por muitas vezes, as decisões que mais influenciam neste processo não são feitas por Designers, mas, sim por ‘Silent Designers’ – profissionais que não são Designers, mas possuem poder sobre o resultado do projeto.

‘Mas quem são Silent Designers? De onde eles vem? Do que vivem? Descubra isto hoje, no Globo Repórter!’. Brincadeiras à parte, eles vem de vários lugares (muitas vezes de esferas superiores) e estão embasados em ideias do tipo “Deus quis assim e ponto final”.

Além de criar tensões coporativas no dia a dia dos Designers, os Silent Designers (ou os Deuses, como queiram) podem personificar dilemas uma vez que podem ser os entusiastas da melhoria da prática do Design nas empresas e, ao mesmo tempo, os maiores entraves para seu êxito.

3. Gestores são de Marte, Designers são de Vênus.

É indiscutível que os gestores possuem um papel importante na inserção do Design dentro das empresas, uma vez que coordenam e gerenciam os espaços que os Designers possuem dentro dela. 

(Isso é tão óbvio que não é preciso nem fazer uma pesquisa nas empresas para perceber isto, não é mesmo?) No entanto, o que a investigação deixou bem claro é que muitos gestores desconhecem a área do Design. (Infelizmente.) E além de não compreenderem completamente os seus benefícios, entendê-la é, por vezes, um paradigma. Para alguns gestores, o Design trata da incerteza e isto é antagônico aos seus mindsets que foram historicamente treinados para evitar riscos e, portanto, buscam (mesmo que inconscientemente) soluções baseadas em respostas previamente utilizadas, pois novas ideias estão intrinsecamente relacionadas com incertezas.

Por tudo isto é que muitas empresas ainda valem-se da ideia de que “não se mexe em time que tá ganhando”. E isso é m-u-i-t-o ruim! Pois enquanto que o time estiver com a mesma equipe e o placar sem muitos sobressaltos, os espaços de atuações dos Designers tendem a continuar sendo restritos.

4. “Investimentos” em outros setores, “gastos” com o Design.

O Design é um processo que envolve inúmeras pessoas e coisas.  Quando o resultado do processo de Design é tangível, como o que se percebe com produtos, é relativamente simples evidenciar sua contribuição. No entanto, quando os benefícios da atividade são intangíveis, tais como comportamento corporativo, cultura e experiência, seus impactos são muito menos claros.

E isto pode ser muito mal em vários aspectos, como, por exemplo, para uma tomada de decisão de investimentos na área do Design. Sabe aquela ideia de ‘O Papai Noel vai trazer presentes apenas para as crianças que se comportaram durante o ano’? Então, como que os Designers irão receber seu ‘presentes’ se o Papai Noel não consegue ver todos os seus ‘bons comportamentos’?

Brincadeiras à parte, o que eu quero dizer é que os custos relacionados com o Design ainda são vistos, em alguns casos, como “gastos” enquanto que aqueles direcionados para outras esferas das empresas são chamados de “investimentos”. Se você não entendeu o que quis dizer, pense na diferença conceitual entre as palavras investimento e gasto! 

Essa diferenciação é muito séria, pois gastos e investimentos são concepções completamente diferentes e que dizem muito da interpretação (equivocada) dos benefícios do Design neste cenário.

No entanto, para que você não se desanime lendo este artigo, lhes digo: nem tudo são espinhos. (Depois de bater a gente assopra, né? Risos.) Mesmo percebendo que o caminho do reconhecimento da importância da área ainda seja árduo por inúmeros aspectos, é preciso lembrar-se de tudo que já se evoluiu até o momento!

Em 2002, por exemplo, quando entrei na faculdade, as pessoas mal sabiam do que se tratava e ficavam bastante perplexas em saber que cursos superiores ensinavam ‘isso’.

Além disto, devemos lembrar que todos estes aspectos que  eu observei nas empresas só existem porque também existem setores ou pessoas relacionadas com o Design nas companhias. Portanto, se o desafio de hoje é aumentar a implementação do setor do Design para um âmbito mais estratégico nas companhias, há 15 anos atrás era implementar setores de Design nas empresas.

Ou seja, a luta tem surtido efeito! E é por isto que devemos continuar lutando para elevar a importância do Design dentro das empresas. Já fizemos muito, mas ainda temos bastante a se fazer. Então vamos parar com este conversê e mãos à obra!

*Caso você queira ler o relatório completo desta pesquisa, clique aqui.

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